
O Som do Rugido da Onça acompanha a trajetória de Iñe-e, uma criança indígena capturada e levada para a Europa no século XIX por cientistas alemães, especialmente Carl Friedrich Philipp von Martius. Além dela, outras sete crianças foram forçadas a deixar suas famílias e embarcar no navio. No entanto, apenas Iñe-e e Juri, uma criança de uma tribo rival, sobreviveram. Ali, naquele momento, Juri não era mais um inimigo, mas um irmão na luta contra a brutalidade.
É impossível não ficar chocado com a desumanidade dos cientistas, que levaram amostras de tudo o que podiam – plantas, animais, rochas, sementes e CRIANÇAS. A ciência europeia, aclamada por seu suposto progresso, sempre se sustentou no roubo de vidas, culturas e territórios. Na história oficial, Martius é lembrado por seu conhecimento da fauna, flora e cultura brasileira. Mas, ao longo do livro, vemos que sua ação se confunde, na verdade, com a de um predador cultural. Imagina o quanto já não se perdeu?
Verunschk subverte o olhar convencional da história e dá voz àqueles que foram silenciados, revelando a dor e a resistência dos povos indígenas. Sua narrativa não apenas resgata uma história esquecida, mas questiona o próprio papel da ciência e do conhecimento que se ergue às custas da destruição de culturas inteiras. A obra é uma denúncia à brutalidade do conhecimento que subjuga os povos originários, tratando-os como objetos de estudo.
Já pensou quantos desses cientistas exploradores existiram ao longo da história? Quantos retiraram dos povos originários sua identidade, dizimaram populações, extinguiram idiomas, religiões, culturas e, consequentemente, formas de conhecimento? Curioso, porque era exatamente isso que diziam estar buscando, não era? Desde o começo foi assim. 525 anos de história é muito pouco para se livrar desses traumas, desses malefícios criados pelos europeus em nosso país, sobretudo contra os primeiros habitantes deste território.
Foram mais de 300 anos de colonialismo. Depois disso, ainda tivemos dois imperadores portugueses. E, como se não bastasse, posteriormente ficamos nas mãos das elites, que influenciam até hoje o rumo do país.
O Som do Rugido da Onça: um chamado da selva
O livro me tocou em um ponto crucial: a questão da honra, do nome na história. Essa era a principal ambição dos cientistas da época, e não realmente desempenhar um papel humano, enxergando os outros como iguais – seres humanos com sentimentos, emoções, dores, afetos e felicidades.
O Som do Rugido da Onça vem como um grito para olharmos para os povos originários e refletirmos: Espera aí, por que a Europa é tão “evoluída” e nós ainda estamos nos desenvolvendo? Por que eles são tão ricos? A narrativa desafia a ideia de que a curiosidade intelectual pode justificar a violência, convidando o leitor a refletir sobre as consequências do apagamento histórico promovido pelo colonialismo acadêmico europeu.
Com uma prosa poética e contundente, O Som do Rugido da Onça não é apenas uma obra literária, mas um chamado à justiça histórica e à memória daqueles que tiveram suas vidas tomadas em nome do progresso alheio.
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